Ilustrativa
O atual cenário do Sistema Cantareira preocupa os cientistas tanto em relação ao histórico mais recente quanto diante dos últimos 18 anos. “Quando observamos o primeiro semestre de 2021, o cenário segue preocupante, registramos 587,9 mm de chuva, o equivalente a 68% do previsto para o período. Até o momento, o Sistema ficou abaixo da média, em todos os meses de 2021, algo que não aconteceu nenhuma vez desde 2003. No acumulado dos últimos 12 meses, estamos 468 mm abaixo da média histórica. Se ampliamos o período da análise para os últimos 18 anos, encontramos algo próximo, apenas em 2014, período de crise hídrica”, alerta Alexandre Uezu coordenador do Projeto Semeando Água, iniciativa do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas.
Em junho de 2021, choveu menos da metade do esperado no Sistema Cantareira, apenas 26,1mm. A média histórica do mês é de 57,1mm. Em julho de 2021, no dia 10, por exemplo, o Sistema contava com 43,8% do volume, cerca de 10% a menos em comparação à mesma data em 2013 – pré-crise hídrica, com 55,9%.
O Sistema Cantareira abastece cerca de 7,6 milhões de pessoas na região metropolitana de São Paulo, além de Campinas e Piracicaba. Para quem vive na região, o baixo volume já é visível, em especial nos municípios de Bragança Paulista, Piracaia e Joanópolis. “Ainda temos pela frente ao menos mais três meses do período de seca na região – julho a setembro. Isso se tivermos a chegada da temporada de chuvas em outubro, o que não aconteceu em 2020, por exemplo”, destaca Uezu.
O cenário na região Sudeste onde está localizado o Sistema Cantareira, sem dúvida inspira atenção. No final de maio, o Governo Federal, por meio do Sistema Nacional de Meteorologia (SNM,) publicou uma nota de Alerta de Emergência Hídrica associado à escassez de precipitação para a região hidrográfica da Bacia do Paraná que abrange os estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná para o período até setembro de 2021.
A nota técnica de Alerta de Emergência Hídrica é assinada pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e pelo Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (CENSIPAM) com a participação dos órgãos federais ligados à meteorologia, e com a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (CEMADEN).
Transformação na paisagem
Além do baixo volume de pelo menos mais da metade dos reservatórios que formam o Sistema Cantareira, algo que também está visível é o tamanho do desafio – que uma vez superado tem o potencial de contribuir com a quantidade de água que chega aos reservatórios.
“A baixa permeabilidade do solo em boa parte do Sistema Cantareira agrava o cenário. O melhor lugar para armazenar água da chuva é no solo, já que assim a água é liberada aos poucos, em especial nos períodos de estiagem, mas para isso a água precisa ter tido a condição de infiltrar – o que ainda não acontece em boa parte do Sistema Cantareira”, explica o pesquisador Alexandre Uezu.
Entre as ações prioritárias para a região, está o plantio de 35 milhões de árvores nas áreas próximas às nascentes e aos cursos d’água (chamadas APPs hídricas – Áreas de Preservação Permanente), uma vez que 60% delas estão desmatadas, segundo o Atlas do Sistema Cantareira, elaborado pelo IPÊ, que já plantou na região 370 mil mudas de árvores nativas da Mata Atlântica, em conjunto com a iniciativa privada e com pessoas físicas.
Entre as medidas trabalhadas para contribuir com o aumento da segurança hídrica do Sistema Cantareira está também a melhoria do uso do solo, por meio da implementação de sistemas produtivos sustentáveis. Segundo informações do Atlas, é preciso recuperar cerca de 100 mil hectares e torná-los aliados da segurança hídrica. Manejo de pastagem ecológica, agrofloresta, silvicultura de nativas e sistema silvipastoril estão entre as práticas implementadas pelo projeto do IPÊ. “Mudanças que melhorem o uso do solo e possibilitem que a água infiltre têm o potencial de aumentar a produção no campo e a lucratividade para o proprietário que passa a desempenhar o papel de aliado da segurança hídrica”, completa Uezu.
Nessa mesma direção, o Plano de Manejo das Áreas de Proteção Ambiental (APAs) Sistema Cantareira e da Represa Bairro da Usina, no interior de São Paulo, por meio do Decreto nº 65.244, de 14 de outubro de 2020, estabelecido pelo governo do Estado de São Paulo, busca fomentar o desenvolvimento sustentável da região e ao mesmo tempo conservar os recursos naturais. “Entre as alternativas que têm o potencial de contribuir com o desenvolvimento da região, considerando os pilares da sustentabilidade – as dimensões econômica, social e ambiental integradas – está a agricultura com sistemas produtivos de base agroecológica, por exemplo. Atualmente, a agricultura e a pecuária na região, em geral, são baseadas no modo de produção tradicional e revelam baixa produtividade, o que gera impacto no solo, reflete na segurança alimentar e influencia diretamente a economia, já que em tempos de escassez, há aumento dos preços dos produtos. O Plano de Manejo, neste caso, indica melhores formas de uso do solo para que os serviços ecossistêmicos (polinização, água, regulação do clima) garantam a produção e a produtividade adequadas”, afirma Simone Tenório, pesquisadora e coordenadora de Políticas Públicas do IPÊ.
O Plano estimula e fortalece o Turismo no curto, médio e no longo prazo. Os principais atrativos da região são os recursos naturais, as represas, as áreas com Mata Atlântica conservada, nesses locais é possível praticar esportes aquáticos, realizar trilhas, observar aves, visitar Unidades de Conservação, além das propriedades que têm potencial para receber o turismo rural e o agroturismo. O Plano traz diretrizes para que todas essas atividades sejam realizadas de forma a não comprometer o futuro da região, responsável pelo abastecimento de água de 7,6 milhões de pessoas da região metropolitana de São Paulo.
O Projeto Semeando Água, do IPÊ, conta com apoio da Caterpillar Foundation, da Tree Nation, da FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. São parceiros do projeto: a UFLA – Universidade Federal de Lavras, a UFSCAR – Universidade Federal de São Carlos, Unifesp – Universidade Federal de São Paulo (São José dos Campos), Instituto Florestal, entre outros.
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